A pedido de muitos leitores, aqui segue a transcrição do nosso artigo da última semana no Diário Económico. E ainda os comentários de alguns dos muitos leitores.
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O Governador tem razão!
Por mais competência e idoneidade que tenham os reguladores e seus quadros, fraudes vão continuar a existir. É da natureza humana…Paulo Gonçalves Marcos
As últimas semanas têm sido pródigas em ataques ao Banco de Portugal e ao seu Governador, a propósito das fraudes alegadamente verificadas no Banco Português de Negócios. Como se o Regulador e Supervisor do Sector Bancário fosse um cúmplice dos alegados vilões que dirigiram o banco de negócios em questão. Não podemos estar mais em desacordo com esta visão. Em nosso entender o Banco de Portugal tem estado à altura dos acontecimentos. A Supervisão funcionou. E tem impedido que outros potenciais casos tenham surgido no mercado português. A falência de bancos é uma coisa relativamente comum. Aliás, a falência de empresas é uma realidade insofismável de qualquer economia de mercado: pune quem não conseguir captar e fidelizar clientes. Mesmo a falência fraudulenta, quiçá sonante de grandes bancos é, no panorama internacional, menos que rara. Sem querer entediar o leitor, vale a pena relembrar algumas. Aqui ao lado, em Espanha, o caso Banesto. Conde, o empresário mais admirado, à época, pelos espanhóis, em quem os conservadores do país vizinho depositavam grandes esperanças de rivalizar com o socialista primeiro-ministro Filipe Gonzalez, liderou a fraude, cometida curtos meses após um aumento de capital de 700 milhões de euros (M€), intermediado pelo sóbrio e sólido J.P. Morgan (que haveria de subscrever, em simultâneo, para um fundo seu, 175 M€, tornando-se no maior accionista do Banesto!). O buraco, detectado pelo Banco de Espanha, foi de 4.000 M€. Poderíamos continuar a lista enumerando casos espectaculares em que a não existência de controlos e de sistemas de cumprimento eficazes, tornaram possíveis a falência do mais que centenário Barings Bank (obra de Nick Leeson) em 1995 com uma perda superior a 1.200 M€; a perda de 800 M€ do Daiwa Bank (1995) no Japão; outra perda de 5.000 M€ na Société General, em França, no início de 2008; pelo meio outras que deram brado à época: Amaranth Advisors, um ‘hedge fund’ que especulava contra o preço futuro dos contratos do gás (2006) ou o Bank of Credit and Commerce Internacional (1991) onde os príncipes árabes se viram chamuscados. Portanto, o caso BPN é um fenómeno não exclusivamente português, incidindo também em praças e mercados financeiros tidos como os mais sofisticados e regulados do mundo. A existência de fraudes, no sistema financeiro ou noutros (Enron, Parmalat,etc), é normalmente função de um triângulo pernicioso: oportunidade detectada + pressão (para apresentar resultados) + racionalização (auto explicação para o comportamento desviante). A ganância também pode causar erosão nos valores éticos individuais e facilitar a racionalização em termos que seriam inaceitáveis. Contudo, muitos dos prevaricadores são influenciados pelo meio envolvente, mormente por colegas e pela cultura da empresa. Pelo que estas devem ter políticas éticas bem explícitas. Permanentemente zeladas pela Gestão de Topo. O caso BPN ilustra apenas a falha generalizada do estabelecimento de um conjunto de Políticas e Procedimentos de Ética de negócios e a forma mitigada como Valores Éticos eram guião da orientação profissional. Por isso, não são os sessenta técnicos do Banco de Portugal afectos à Supervisão Prudencial que são poucos. Parece-nos que o número ou a qualidade destes e do seu trabalho (lendária no mercado português, pela positiva, atente-se) são adequados e comparam bem com as práticas internacionais, mais a mais considerando o pequeno número de instituições sedeadas em Portugal. Quiçá a ausência de experiência em Banca Comercial ou de Investimento de quadros e dirigentes do Banco de Portugal possa ser uma pequena desvantagem relativa. Quiçá, igualmente, a opção do Banco de Portugal em querer regular coisas bem menores, como campanhas publicitárias ou os folhetos dos produtos financeiros, tenha desviado a atenção e a energia da gestão de topo e dos quadros do Regulador. Mas isso não invalida dizer que o Banco de Portugal e o seu Governador não são prevaricadores; o número de casos e incidências verificados no mercado português é mínimo e sem a gravidade que outros mercados experimentaram. E que a actuação do Banco e do seu Governador foi correcta do ponto de vista técnico. Enquanto árbitro, mas não jogador. Não lhes competia escolher os bancos vencedores no jogo do mercado. E por mais competência e idoneidade que tenham os reguladores e seus quadros, fraudes vão continuar a existir. É da natureza humana…Basta que o triângulo pernicioso esteja presente.
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Paulo Gonçalves Marcos, Economista, gestor e professor universitário
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