quinta-feira, dezembro 20, 2007

Lugares vazios nos estádios...! Artigo no Diário Económico









Lugares vazios nos estádios…

Será que se passa algo com os associados mais históricos e ferrenhos dos grandes clubes de futebol portugueses?

Paulo Gonçalves Marcos

Lugares vazios, muitos, entre aqueles que têm uma forte e antiga ligação ao clube. Mesmo em importantes jogos europeus ou da Liga portuguesa. Um cenário que se repete pelos estádios de futebol portugueses. E que tem vindo a agravar-se de época para época. Será que se passa algo com os associados mais históricos e ferrenhos dos grandes clubes de futebol portugueses? Ou teremos apenas um clássico problema de preço e de marketing?

A maioria dos gestores das organizações percebe, admiravelmente, o impacto do preço sobre a procura de seus produtos. Mas a compreensão sobre a procura é, no máximo, assaz mais incipiente…O que procuramos ilustrar neste artigo é como o preço e a forma de venda têm um impacto tremendo sobre o consumo e sobre as probabilidades de repetição da compra. Como as decisões financeiras de venda antecipada de espectáculos têm impactos financeiros profundos a longo prazo…

A venda em pacote, de vários produtos, tem como função estimular a compra de mais que aquilo que os compradores inicialmente teriam planeado. O caso do pacote de jogos anual que os clubes portugueses colocam em venda ainda antes de começar cada nova época, não é substancialmente diverso dos pacotes dos bancos (com as contas ordenado, os cartões e as domiciliações), da Orquestra Gulbenkian (com as assinaturas anuais), dos ginásios ou mesmo dos clubes de Ténis e Golfe.

Imediatamente após o desembolso, o comprador sente a necessidade de justificar o investimento. Aumenta então, exponencialmente, o seu consumo do produto. Ao fim de algum tempo, pouco, diminui o “peso da consciência”. E a necessidade psicológica de consumir (assistir aos jogos…) decorrente da supracitada justificação. O fenómeno tende a ser agravado pelo empacotar dos jogos de época num preço único, o que leva a que o adepto ou associado perca a noção do custo unitário. Em alguns casos, ao fim de algum tempo, pode mesmo considerar que os jogos passaram a ter um custo nulo, e comportar-se como tal.

Ou seja, tudo o que é grátis não tem valor… ademais quando a equipa começa a jogar menos bem… e se o título se torna progressivamente uma miragem… o adepto pára de consumir assistências aos jogos… e de comer e beber no estádio… ou de comprar produtos alusivos ao seu clube… Mais grave, todos os estudos empíricos o demonstram, as probabilidades de repetir a compra dos lugares cativos ou dos lugares de época, reduzem-se substancialmente… O que leva o clube a um esforço sempre renovado e titânico para captar novos “assinantes” para os seus produtos de época inteira…

Por mais que a captação avance, o número de consumidores não aumenta… um pouco como a alegoria em que a água que entra na piscina é perdida pelas fendas na base da mesma...

Organizações onde a venda atempada dos produtos também se coloca, como fizemos alusão anteriormente, têm adoptado várias estratégias que permitam a seus clientes (“associados”) perceber claramente o valor daquilo que adquiriram. Alisar o desembolso, de forma a que a psicologia de compensação funcione, é uma das formas. É o caso dos bancos que depois da aquisição enviam informação ao cliente mostrando o quanto lhes custaria a aquisição em separado de cada um dos produtos da conta ordenado ou dos hotéis que exibem o menu da meia pensão lado a lado com o preço dos mesmos pratos adquiridos individualmente. Ou ainda dos ginásios, que procuram alisar a procura de seus serviços, que a par da jóia de entrada e apesar da venda da assinatura anual (contratos mínimos de 12 meses), diluem a cobrança desta em mensalidades iguais. Desta forma asseguram que o grosso dos seus clientes continua a usar os serviços para além da primavera… de forma regular. Com isso aumentam as probabilidades de renovação da assinatura… e poupam nos investimentos de marketing e comerciais de angariação de novos clientes. Mantendo os clientes actuais…

www.marketinginovador.com
paulo.marcos@marketinginovador.com
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Paulo Gonçalves Marcos, Economista, gestor de empresas e professor universitário

Comentários
Bruno Valverde Cota (bruno.cota@marketinginovador.com)
Quando o desafio é a fidelização, com repetição de consumos, não há limites à criatividade das organizações. Parabéns e Boas Festas.
vg
O conceito de "à duzia é mais barato" é mais antigo que as teorias do marketing.Até há quem compre assinaturas na Gulbenkian para garantir acesso a um ou dois concertos de excepção.Nos tempos de hoje,focar algo que venha em quinto ou sexto lugar é dificil.A entrada tem de ser aliciante.Para já!...
Maria Chapelle
Nunca tinha visto o assunto por esta óptica. Claro que vender exige esforço. Mas colocar os clientes a consumir, fidelizando.os, requer mais que esforço ou simpatia...
Diogo
O Caso do Holmes Place é também um exemplo do que refere no seu artigo. Cerca de 80% dos assinantes de pacotes anuais não põe os pés nos ginásios. É mau ter um estádio vazio, mas se se já venderam os lugares, menos mau! Cmps
Carlos Gonçalves (cg@espacoavila.com)
Interessantes estas analogias. A aquisição de pacotes de bens ou serviços têm que trazer necessariamente mais valias para os consumidores. Garantir a qualidade desses bens e serviços é naturalmente a chave do sucesso, e não apenas o preço competitivo. No caso do futebol português (à excepção do FC Porto), as variáveis não controláveis pelo clube-empresa são tantas, que esta estratégia provavelmente se torna arriscada.

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