O Governador
Tem-se visto na imprensa a recomendação da renovação do mandato do Governador do Banco de Portugal. Tal decisão por parte do Governo seria um erro. A função de Governador é uma das mais poderosas da democracia portuguesa. É a única pessoa com voz activa no Banco Central Europeu, que é o primeiro responsável pela condução da política monetária da zona euro POR JOÃO BORGES ASSUNÇÃO
»» A sua escolha deve ser sempre muito ponderada. E a repetição de mandatos por parte da mesma personalidade deve ser sempre justificada pela positiva. Como esta função não é eminentemente técnica ou científica, a não recondução de uma personalidade não deve ser interpretada como um parecer negativo sobre as suas competências técnicas.
O Banco de Portugal assume uma tripla função entre nós: participa na condução da política monetária da zona euro, regula o sistema financeiro nacional, e assessora e "fiscaliza" o Governo em matéria de finanças públicas e política orçamental.
A política monetária da zona euro tem sido conduzida de forma positiva durante o mandato do actual Governador. Alguma quota de responsabilidade lhe coube neste sucesso.
Na supervisão do sistema bancário português não há também reparos excessivos a fazer, embora pudesse ter sido menos leniente e mais prudente obrigando a que as instituições financeiras registassem os seus activos a valores de mercado de forma mais célere.
Mas é no último capítulo, o da assessoria e fiscalização do Governo, que o Governador teve um papel menos eficaz. Em particular, deixou-se envolver excessivamente com a política orçamental e fiscal do actual Governo, não criando para si próprio e para a instituição que representa a distância adequada.
Muitos acreditam que teve um papel activo na formação do XVII Governo e da aprovação das linhas orientadoras da sua política económica e orçamental. Teve uma participação polémica em várias comissões de avaliação das contas públicas, algo que o falecido Duisenberg referiu ter recusado fazer a pedido da Rainha da Holanda.
Finalmente a questão do sistema de pensões do conselho de administração do Banco de Portugal afectou, de alguma forma, a sua credibilidade e imagem de actor independente que pugna pelo rigor, equidade e eficácia da nossa economia.
Creio, portanto, que seria melhor para o País que o Governo encontrasse uma personalidade que pudesse suceder ao Dr. Vítor Constâncio no cargo de Governador.Se o Governo o fizer, poderemos agradecer sem reservas o contributo que o actual Governador deu para a democracia portuguesa ao participar no combate ao défice orçamental.
Por João Borges de Assunção, publicado no Expresso no dia 07 de Janeiro de 2006
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