Co-autor do best seller Marketing Inovador
O sector financeiro português está numa boa fase, em termos de internacionalização, e tem sabido aproveitar essas oportunidades?
O momento actual é de grande convulsão nos mercados financeiros internacionais. As crises combinadas do “subprime”, alimentos e energia fizeram com que os mercados tivessem fortes quebras, primeiro, e uma grande volatilidade, mais recentemente. Dentro deste panorama poderemos dizer que o sector financeiro português tem resistido bastante bem, melhor que a maior parte dos sistemas congéneres na Europa e nas Américas. A internacionalização do sector financeiro português tem-se orientado para mercados e segmentos onde existe uma vantagem comparativa de cariz concorrencial. Assim, países onde as empresas portuguesas tenham uma forte base instalada produtiva ou comercial (Angola, Espanha, Brasil) ou possuam afinidades culturais e civilizacionais (Cabo Verde, por exemplo) ou onde o grau de desenvolvimento dos mercados pode proporcionar que as empresas portuguesas introduzam técnicas de gestão ou marketing mais sofisticas (Polónia, Roménia, Ucrânia, Argélia, entre outros), têm sido os alvos preferenciais do notável esforço de internacionalização encetado desde meados da década de 90. E aqui o que vemos é um padrão de internacionalização de cariz estratégico mais que a mera tentativa de aproveitar mercados de destino de emigração. A aposta em serviços de elevado valor acrescentado (gestão de activos, private e corporate banking, investment banking) ou no domínio dos factores estratégicos de concorrência (redes de retalho, com a sua proximidade e conveniência) é a marca da nova internacionalização do sector financeiro português.
Na sua opinião, quais são os pontos que Portugal tem a seu favor nesta internacionalização? E os que tem contra e precisa de melhorar?
Pontos fortes: excelente capacidade técnica na banca de retalho (marketing, sistemas de informação, vendas) e na banca de aconselhamento (private e affluent banking, Project finance, Corporate finance); boa relação com as empresas portuguesas mais dinâmicas e com maior foco na internacionalização; flexibilidade e adaptabilidade de gestores e especialistas técnicos portugueses.
A menor dimensão da Economia Portuguesa, em geral, bem como a menor reputação que as suas empresas e produtos usufruem nos mercados mundiais são obstáculos à internacionalização do sector financeiro português.
Quais as celeumas que pode acarretar esta internacionalização para um mercado financeiro como o português?
A internacionalização resulta de uma busca de segmentos de mercado, em outras geografias, onde as empresas portuguesas tenham capacidade de transportar conhecimentos ou outro tipo de sinergias. E deverá ter, como resultado, melhores rendibilidades dos capitais próprios, logo, maior capacidade de atrair e remunerar capitais ao nosso país. Para uma pequena Economia aberta ao exterior, como a portuguesa, a internacionalização surge com um imperativo estratégico para o desenvolvimento económico que almejamos. E temos vários exemplos de outras pequenas Economias que têm aproveitado singularmente o fenómeno da globalização e da internacionalização para prosperarem. Claro que teremos que reter que existem alguns riscos, como a exposição a riscos do país ou riscos sistémicos de magnitude diversa. E para isso o esforço de internacionalização deve ser acompanhado do reforço das capacidades endógenas de avaliação e mitigação de risco.
Ao que devem estar atentas as entidades financeiras (bancos, seguradoras, etc) nesta internacionalização?
Dada a falta de dimensão relativa das instituições portuguesas, a ênfase terá que ser na especialização e na transferência de competências de um mercado altamente desenvolvido como o português, para outros mercados e segmentos onde o nível de especialização ou sofisticação não é tão intenso. Mais do que a busca por quotas de mercado, a internacionalização deve orientar-se por critérios de rendibilidade.
A internacionalização pode ser considerada um “móbil” de risco para o desenvolvimento de banco e/ou seguradora, tendo em conta que os objectivos possam passar por uma rentabilidade quase imediata que pode ser prejudicial?
Não. Os gestores do sector financeiro conhecem bastante bem que os projectos de investimento carecem de um prazo para a recuperação dos capitais investidos. A lógica nunca é de um retorno imediato, mas sim de uma rendibilidade das operações que sejam sustentáveis a médio e longo prazo. Portanto, não julgo que os bancos e as seguradoras portuguesas (mas também as gestores de activos e de fortunas, as boutiques financeiras, entre outros) padecem de uma “miopia” de curto prazo.
Que importância atribui à hegemonia da regulamentação, sobretudo ao MiFID, neste processo de internacionalização?
Bastante. Um dos objectivos políticos últimos da MIFID é o de alargar o Mercado Único de Serviços Financeiros, alargando o leque dos produtos e serviços objecto de um verdadeiro passaporte comunitário. Com os aumentos de concorrência entre prestadores de serviços (de aconselhamento mas também de plataformas de negociação). Nesse sentido o fim do monopólio dos mercados regulamentados abre novas oportunidades ao desenvolvimento do negócio das entidades financeiras. Custos de transacção mais baixos, como resultado do aumento da concorrência e do “upgrade” tecnológico dos prestadores de serviços, serão facilitadores do processo de internacionalização. A utilização do passaporte europeu pode ser uma vantagem importante dos bancos portugueses, reduzindo a complexidade do seu processo de internacionalização.
Que desafios se colocam a Portugal, e ao resto do mundo, neste processo de internacionalização do sector financeiro?
A internacionalização coloca vários desafios às instituições, mormente portuguesas. Senão vejamos:
- a internacionalização é importante para sustentar crescimentos da conta de exploração quando o mercado doméstico exibe sinais de maturidade e de concorrência exacerbada;
- o esforço de internacionalização deve ser visto não apenas ao nível dos requisitos de capital mas também ao nível dos requisitos sobre a Gestão (novos clientes e concorrentes; ambientes regulatórios e de Compliance diferentes dos habituais nos mercados domésticos; expatriação de quadros; desafio de novas línguas e culturas). Isto dentro duma linha estratégica mais vasta em que apenas uma adequada rendibilidade de capitais próprios é susceptível de assegurar a manutenção dos centros de decisão financeiros em Portugal. O crescimento de activos e de rendibilidade, essencial para preservar a capacidade estratégica de decisão e acumulação em Portugal, requer, sem dúvida, o continuar do processo de internacionalização. Diria que é condição necessária, conquanto não suficiente!
In Banca & Seguros #157.