Voltar aos Açores
Há dez anos os índices de desenvolvimento turístico dos Açores eram modestos em comparação com outras regiões do país.Vítor Neto
Açores. Diferentes de tudo. Uma paisagem única, que nos surpreende a cada passo, um mar misterioso e profundo, mas que atrai, gente tranquila e amável. Fica-se sempre com vontade de voltar.
Para quem, como o viajante, tem acompanhado o desenvolvimento dos Açores, não foi surpresa o que encontrou nesta visita para participar nas Jornadas Técnicas de Turismo organizadas pela CCIPD (Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada). Há dez anos os índices de desenvolvimento turístico eram modestos em comparação com outras regiões do país. Os dados mais recentes confirmam os progressos realizados. Não se trata de fruto do acaso, sobretudo tendo em conta os condicionalismos de uma região insular. Há razões que importa sublinhar.
É indesmentível que, entre 1996 e 2006, mais do que duplicou a oferta hoteleira e o número de camas (hoje 8500), que as dormidas dos turistas triplicaram, atingindo os 1,2 milhões e as receitas na hotelaria triplicaram, chegando aos 55 milhões de euros. A quota das dormidas na região em relação ao todo nacional passou de 1,5% para 3,1%. A estadia média aumentou 35%, atingindo os 3,5 dias. Melhoraram as taxas de ocupação.
São claras as alterações estruturais no turismo dos Açores: os turistas portugueses aumentaram e continuam em primeiro lugar, mas o seu peso relativo em relação aos estrangeiros diminuiu, passando de 73% para 45%. Alargou-se o leque dos mercados estrangeiros, com Dinamarca e Suécia em posição destacada, seguidas de Alemanha, Finlândia, Noruega, Reino Unido, E.U.A., Holanda e Espanha. Fizeram-se progressos no transporte aéreo (Sata, Tap, charter´s) e há negociações com companhias ‘low cost’. O número de trabalhadores na hotelaria e restauração (8000) já representa 20% da população activa.
Estes dados reflectem o aumento do peso do turismo na economia dos Açores, que se deve, em primeiro lugar, a uma clara assunção política por parte dos responsáveis regionais da sua importância estratégica para o desenvolvimento da região. Em segundo lugar, à consciência dos condicionalismos que dificultam a actividade turística: a localização geográfica periférica em relação aos mercados emissores; a limitação e dispersão territorial (2300 km2 em nove ilhas); a escassez e características dos seus recursos turísticos; o fraco desenvolvimento económico e empresarial; as limitações do transporte aéreo; o pouco interesse dos grandes operadores. Em terceiro lugar, à convicção de que os Açores também possuem alguns trunfos fortes no turismo: a sua Natureza, única, que determina a beleza e o exotismo da paisagem. Uma Natureza com recursos extraordinários, susceptíveis de dar vida a uma oferta turística original, que vai da fauna marítima ao vulcanismo, da praia ao golfe e aos passeios pedestres, da cultura e património à gastronomia, com capacidade para atrair visitantes.
O que é facto é que os Açores conseguiram traduzir tudo isto numa visão estratégica adequada, numa perspectiva de desenvolvimento sustentável, a única que pode permitir preservar e potenciar os recursos extremamente frágeis em produtos e em oferta turística capaz de sensibilizar públicos especiais dos grandes mercados emissores da Europa e EUA., servidos por um alojamento que se moderniza e propostas de lazer complementares como o golfe, a animação, os eventos.
É interessante verificar que os responsáveis regionais procuram traduzir e suportar a sua estratégia de turismo sustentável com instrumentos políticos eficazes. É o caso da recente aprovação de um Plano de Ordenamento Turístico da Região Autónoma dos Açores (POTRAA), que consagra objectivos de crescimento moderado, numa perspectiva de sustentabilidade, define o modelo territorial no sistema urbano e rural e define as áreas e espaços específicos de desenvolvimento e vocação turística. Por outro lado, em colaboração entre o Governo Regional, a universidade e a Associação de Turismo dos Açores, foi criado um Observatório do Turismo, para acompanhar, estudar e monitorizar o desenvolvimento da actividade.
Os Açores procuram alternativas às soluções fáceis. É uma estrada difícil, mas necessária. Um caso a acompanhar.
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Vítor Neto, Empresário, presidente do Nera e vice-presidente da AIP