"Não estou preocupado com as listas de espera", disse o nóvel ministro da saúde quando confrontado com as mais de 200.000 pessoas em lista de espera para uma cirurgia. Agora percebemos porquê...
O 'interesse público' e o aborto privado Alexandra Teté *
Na passada terça-feira, o senhor ministro da Saúde anunciou que vai recorrer a clínicas privadas para garantir às mulheres portuguesas um aborto legal, quando este não é "resolvido" nos hospitais públicos. Assim, seria prosseguido o "interesse público", torneando o alegado incumprimento da lei naquelas instituições e a invocação de objecção de consciência por parte dos médicos. Não sabemos bem se esta é uma determinação do Governo ou o desabafo de uma aspiração pessoal do senhor ministro com os jornalistas. De qualquer modo, trata-se de uma orientação "chocante", precipitada e perigosa, como passo a explicar.Em primeiro lugar, não está provado que em Portugal os hospitais incumpram a lei. Não se conhecem números, queixas, relatórios, etc. Infelizmente, sobre esta matéria pouco ou quase nada sabemos. Por isso mesmo, é da maior importância o famoso estudo encomendado pelo Parlamento para conhecer realmente a realidade do aborto (legal e clandestino) em Portugal, que finalmente foi aprovado. Parece que o senhor ministro prefere as suas suspeitas.Por outro lado, não se vê porque é que nas clínicas privadas estaria garantida a uniformidade de critérios que se alega faltar nos hospitais públicos. Não se compreende porque é que os critérios que seriam seguidos nas clínicas privadas seriam mais justos, razoáveis ou equilibrados que os que vigoram nos hospitais públicos. Nem se percebe porque é que nas clínicas privadas haveria menor recurso à objecção de consciência.Será que se está simplesmente a tentar legalizar um conjunto de clínicas que não só trabalham em Portugal de forma ilegal como praticam o aborto a pedido? A notícia de terça-feira neste jornal "Não dá jeito agora o bebé, não é?..." parece apontar nessa direcção.É difícil perceber qual é a ordem de prioridades deste Governo e, em particular, do senhor ministro da Saúde, nos assuntos relacionados com a saúde dos Portugueses. Há dias afirmava ser "irrelevante" que milhares de Portugueses estejam em lista de espera para cirurgias nos hospitais. Porque não se lembrou o senhor Ministro de protocolar estas cirurgias com clínicas privadas? Não são estas do interesse público?Ou será que na base desta preocupação do senhor Ministro da Saúde com o "interesse público" está a secreta esperança de que as clínicas privadas não sejam demasiado escrupulosas e dispensem pruridos de consciência? Assim, o senhor Ministro conseguiria liberalizar o aborto, na prática, passando-o para o sector privado e para a opacidade, a expensas dos contribuintes. E porquê esta prioridade nas vésperas de um referendo que se assume vir a liberalizar o aborto? Porque a liberalização do aborto, para alguns, corresponde a uma obsessão ideológica uma obstinação radical em recusar o valor intrínseco da vida humana. Senhor ministro: é isto o "interesse público"?*Associação Mulheres em Acção
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